Tenho medo do amor

Tenho medo do amor.

O amor é a grande arena onde luto diariamente uma batalha de vida ou morte com a Perturbação Borderline de Personalidade.

Como diz o Dr. João Carlos Melo, no livro “Reféns das próprias emoções”, esta é mais relacional de todas as doenças. É no amor, nos afetos, nas relações humanas, que ela se imiscui, que ela deixa sua marca indelével.

Só posso falar por mim e pela minha história, mas daquilo que vivi e vivo, sim, o amor é o meu grande fardo.

Não sei se pela idade, se pelos anos de terapia, se pela infinita paciência de muitos dos que me rodeiam, se por uma soma de todos estes e outros fatores, mas hoje vivo uma vida mais feliz e tranquila, não apenas apesar da doença, mas também, porque aprendi a fazer dela uma aliada, algo que me traz coisas positivas. Porque sentir e viver tudo intensamente, também tem o seu lado belo.

Mas o amor continua a ser o campo minado que temo pisar, não interpretem mal, eu amo, amo pessoas, amo a vida, amo o que faço, continuo a viver com paixão, mas vigio-me constantemente. Cada momento da minha vida é vivido em alerta.

Será que está a ser demais? Será que estou a sufocar esta pessoa? Será?

Eu sou muito, tudo em mim é muito, muito intenso, muito bom, muito mau, muita dor, muito prazer. Tudo extravasa muito além das fronteiras do meu próprio ser. O que fez da minha vida e da dos que a mim chegavam uma montanha-russa absurda que parecia não ter fim.

Como saber se naquele dia eu amava ou odiava? Como saber se o que ia sair era carinho, afeto e ternura desmedidas, ou raiva, ódio e maldade?

Afastei muitos dos que me rodeavam, namorados, amigos. A maioria, não por não me amarem – amar-me pode ser terrível, mas também pode ser belo – mas porque tiveram de salvar a sua própria sanidade.

Muitos tentaram ajudar-me, verdadeiramente, não caridadezinha fofinha, mas realmente o apoio de que eu precisava, mas eu não estava preparada, não era ainda o momento. O momento chegou e, felizmente, estavam lá pessoas para mim, não estava sozinha. E todos os dias agradeço aos que estavam, mas em nenhum momento me esqueço dos que estiveram e sei que amar também é isto, saber quando desistir.

Tenho medo do amor.

Tanto, que o transformei numa armadura de humor retorcido e piadas parvas, que a maioria das vezes só eu entendo e poucos são os que passam além dela.

Tenho medo do amor.

Porque sei que não gosto da pessoa que era quando amava da forma que amava e ainda não tenho a certeza de como irei amar se destruir o muro que construí à minha volta.

Amo, mas com tantas restrições e cautelas, que sei que caí quase no extremo oposto do que vivia antes.

Tenho medo do amor.

E sei que há quem se refira a quem tem (ou é, mas isso é toda outra temática) Borderline como “pessoas que amam demais”, mas continuo a achar que isso de amar demais não existe, existe amar mal. Tão mal que nem sei bem se é amor.

Mas, tenho medo do amor porque não sei se alguma vez vou tornar a sentir o entusiasmo desatado que sentia, mas também tenho medo do amor porque não sei se quero voltar a senti-lo.

Se como o livro acima citado somos “Reféns das próprias emoções” quando sentimos demais, eu sou hoje refém de mim mesma pela vigilância constante a que me submeto.

Talvez um dia encontre o lugar do meio.

E deixe de ter medo do amor.

Texto Anónimo

Janeiro 2025